UERN trabalha na implantação das cotas étnico-raciais

Dia 20 de novembro é marcado como o Dia da Consciência Negra. A data não trata-se, necessariamente, de uma comemoração, pois apesar dos avanços, a sociedade brasileira ainda tem muito a percorrer no que diz respeito à igualdade racial. O dia é, sobretudo, um momento propício para a reflexão, para uma análise da posição do negro na sociedade.

No tocante a ensino superior, é difícil falar da posição do negro na sociedade sem abordar as políticas afirmativas, com ênfase nas cotas raciais. Desde que começaram a ser implantadas, em meados dos anos 2000, as cotas têm contribuído para uma mudança no cenário social e econômico da população negra.

Em consonância com esse cenário de transformações, a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) tem discutido a implantação de cotas raciais. O debate está bastante avançado, inclusive, a Universidade encaminhou para o deputado estadual Fernando Mineiro (PT) uma minuta de projeto de lei tratando sobre o tema, para que a matéria possa ser apresentada, apreciada e aprovada pela Assembleia Legislativa do RN.

A minuta foi elaborada a partir de um estudo feito entre o Gabinete da Reitoria, a Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (PROEG) e a Diretoria de Políticas e Ações Inclusivas (DAIN). Este estudo, por sua vez, teve como base uma pesquisa sobre cotas raciais na Universidade, desenvolvida pelas estudantes Thaysa Lobo e Gabriela Soares, do Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas (GEPP), da Faculdade de Serviço Social (FASSO/UERN), orientadas pela professora Ivonete Soares.

 

Profª. Francisca Ramos

“Toda a proposta para implantação das cotas raciais foi discutida com o DCE (Diretório Central dos Estudantes) que levou o debate para a classe estudantil. Como resultado dessa articulação, elaboramos uma minuta que está para ser apresentada pelo deputado Fernando Mineiro, o qual já faz um trabalho de base com comunidades quilombolas”, informa a titular da PROEG, Francisca Ramos.

Conforme a proposta, dentro dos 50% de vagas que já são destinadas para cotistas sociais, seja definido o percentual de cotistas de pretos, pardos e indígenas, com base no índice populacional informado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Importante frisar que o modelo proposto pela Universidade na minuta do projeto de lei é semelhante ao adotado nas federais”, destaca o subchefe de Gabinete, Esdras Marchezan. A ideia é que, se aprovado na Assembleia Legislativa, as cotas raciais passem a valer para o Sistema de Seleção Unificada (SiSU) de 2020.

“A Universidade tem se empenhado em criar caminhos que promovam a ampliação do acesso ao ensino superior por parte dos nossos jovens. A implantação das cotas étnico-raciais é um compromisso da gestão do reitor Pedro Fernandes e da vice-reitora Fátima Raquel, num diálogo com a comunidade estudantil e com a sociedade em geral. A universidade pública é de todos, e a equipe de gestão tem trabalhado para garantir cada vez mais este direito”, enfatiza Marchezan.

Ciente do seu papel inclusivo, a UERN vem adotando ao longo dos anos mecanismos para minimizar as disparidades sociais e assegurar o acesso ao ensino superior, sobretudo, daqueles que vivem em situação de maior vulnerabilidade social. Hoje, 55% das vagas oferecidas pela Universidade são pelo sistema de cotas: social (50%) e para pessoas com deficiência (5%). Agora, a proposta é incluir dentro desse percentual as cotas raciais.

Profª. Ivonete Soares

Para a professora Ivonete Soares, a implantação das cotas vem contemplar o perfil inclusivo da Universidade, que já tem como referência as cotas sociais e de pessoas com deficiência. “A Instituição cumpre o seu papel de ser uma universidade socialmente referenciada. As cotas contribuirão para dar visibilidade, induzir a autodeclaração e a autoafirmação da identidade da população negra”, avalia.

Presidente do DCE da UERN, Paulo Sérgio enfatiza que as cotas raciais representam ainda uma conquista da classe estudantil. “A luta pelas cotas étnico-raciais confundem-se com a história do DCE e do Movimento Estudantil na UERN. Em 2015, com a criação da Coordenação de Negros e Negras no DCE, e em 2016 com a realização do I Encontro de Negros, Negras e Cotistas da UERN, pela companheira Glisiany Pluvia, na gestão de Tasso Alves, onde tivemos a criação e a formulação da Carta Afirmativa e dentro dela constava a necessidade da aprovação das cotas. As ações afirmativas, nesse entendimento, são uma reparação histórica de sujeitos e sujeitas que tiveram o seu direito à educação superior cerceado de forma direta ou indireta”, diz.

De acordo com a professora Eliane Anselmo, do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB),
as políticas públicas de ações afirmativas voltadas para o negro no Brasil, um passo fundamental para a inclusão social dessa população, é uma iniciativa muito importante do Estado, mas, sobretudo, é uma vitória das lutas históricas empreendidas pelo Movimento Negro brasileiro e intelectuais em prol da valorização do negro e da cultura afro no País. “Essas políticas de ações afirmativas trouxeram grandes avanços sociais, mas ainda temos um caminho muito longo a seguir”, diz Eliane Anselmo.

Profª. Eliane Anselmo

Esses avanços citados pela professora podem ser perceptíveis na evolução dos números referentes à formação superior da população negra. De acordo com dados do IBGE, as chances de ter um diploma de graduação aumentou quase quatro vezes para a população negra nas últimas décadas no Brasil. O Censo do Ensino Superior, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), também evidencia o aumento do número de matrículas de estudantes negros em cursos de graduação, passando de 11%, em 2011, para 30%, em 2016, ano do último Censo.

“As cotas raciais viabilizam a valorização do negro, possibilitando sua inserção em um espaço de formação público, gratuito e de qualidade. A UERN tem um papel social, e as cotas são uma oportunidade de jovens negros terem acesso ao ensino superior e poderem modificar a sua realidade e de sua família”, finaliza Francisca Ramos.